A correria de uma Nação que não se deixou ser!

Caleidoscopio

Que país é esse? Essa é uma questão histórica bastante atual. Porém, não tenho por objetivo, hoje, apresentar respostas a essa pergunta, mas sugerir algumas reflexões e questionamentos importantes a respeito de quem gostaríamos de ser, quem somos ou o que precisamos ser enquanto Nação.

Somos uma Nação impaciente e apressada para construir o país, como muito bem aborda Octavio Ianni em seu livro A Ideia de Brasil Moderno. Essa impaciência sugere aquela necessidade de deixar para traz tudo o que fosse contraditório com a ideia de modernidade já no final do Século XIX e por todo o Século XX, o seja: A escravidão, os indígenas, os regionalismos nordestinos.

Para isso seria preciso criar um Brasil. O deslocamento “dos centros de pensamentos” das escolas teóricas desse novo Brasil para o centro do País revela essa necessidade de esquecimento ou mesmo de folclorização de um passado recente.

E como nada fica impune, muitos teóricos¹ deram e dão as suas contribuições a esse entendimento. As diversas contradições deste mesmo Brasil, já no Século XXI, demonstram que muitas arestas deixadas para depois, na correria, precisam ser abarcadas neste constructo que não findou-se.

Podemos até levantar algumas reflexões importantes: a de que ainda, estamos correndo, apressados para construir um novo país. E a de que é preciso saber, que quando falamos de Brasil, estamos falando de qual? A partir de qual referencia coerente e paradigmas podemos pensar e agir diante do espetáculo das contradições políticas, econômicas e sociais?

Creio que ainda falte aquele detalhe importante que está sempre ficando para traz, aquela tão importante identidade cultural e histórica, que nem muito tem de lusitana, mesmo que muitos se esforcem para isto. Claro que a reconheço e muito, porém o Quem somos de verdade, não está estacionado nos grandes centros, mas no interior do país, marcados pelo grande desafio de reconhecimento e aceitação.

Grande desafio este de compreender as condições, que estão colocadas na contemporaneidade como marcas do que foi deixado para traz. E arrisco criar uma hipótese, a de que essa correria permanece com as mesmas intenções de outrora querendo ser o que não se é!

A ideia de Brasil Moderno frequentemente tem algo de caricatura. Primeiro, caricatura resultante da imitação apressada de outras realidades ou configurações históricas, frequentemente implicadas em ideias, conceitos, explicações, teorias. Segundo, caricatura tornada ainda mais grotesca porque superpõe conceitos e temas a realidades nacionais múltiplas, antigas e recentes, nas quais se mesclam os ciclos e as épocas da história brasileira, como em um insólito caleidoscópio de realidades e imitações. (IANNI, 1992, p, 46).

A história do pensamento brasileiro não é findada, pois o esforço de compreender a sociedade nacional é um caso permanente na construção e reconhecimento da Identidade Nacional. Dentre os vários caminhos para se pensar e teorizar sobre a sociedade, um ponto em comum, a saber, é aquele que ainda pretende-se valorizar ou exorcizar fatos e sujeitos históricos. Peculiaridades do seu período permanente de construção.

O modo de ser brasileiro é o modo de fazer-se brasileiro e esse deveria ser um compromisso de identificação sociocultural e um projeto político com o propósito de dar Instrumentalidade às práticas concretas e subjetivas da realidade contemporânea. Compreendendo ações transformadoras, que ao pensar a realidade de lugares nem sempre privilegiados, deslocados dos centros canônicos farão sentido e possibilitarão o rompimento de véus obscuros e aceitações de realidades que nunca foram reconhecidas.

¹Autores importantes para o aprofundamento teórico: Raymundo Faoro, Antonio Candido, João Cruz Costa, Nelson Werneck Sodré, Florestan Fernandes, Machado de Assis, Euclides da Cunha, Sergio Buarque de Holanda, Caio Prado Junior, Gilberto Freyre, Oliveira Viana.

Fonte: FONTE: IANNI, Octavio. “Histórias do Brasil Moderno”. A Ideia de Brasil Moderno. Brasiliense: São Paulo, 1992.

PRIMAVERA

Aurora

Do largo laço, profundo e augusto,
de uma noite branda.
Enlaço entornos de um céu distante de outono,
em plumas contornando o céu,
que ainda se faz ofegante de aurora.

Em rasgos tempos que ainda persistem
Num quase será que …
Esvai, volta e envolta,
em nó que nunca se faz.

Finda dos tempos em ser único
É só!

Acolhimento das águas

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Agradeço pelo silencio que permeia as horas,
Permitindo ouvir nesse mar que afasta,
Desta terra que me faz sentir.

Poderoso seio, mãe que acolhe rosas brancas
Nas desgraçadas dores da vida.
Sobram vistas que se acendem prateadas pelos ventos que sugerem as horas
E horas,

Vestimenta que segura anseios,
Sobre as asas que teimamos ter
Nestes olhos aflitos de uma Era.
Nada basta deste ser que acolhe,
Na medida investidura de estar. Mas,
O ser nas massacrantes lutas de outrora
Respira ofegante o que pretendes ser.

Linda e pura investidura alva,
Bravios sons que enternecem as almas
Olhos que revelam seres,

E desconhecem a imensa certeza de ser.

Em tempos de crise

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Em tempos de crise descobrimos que nada é permanente, que somos empurrados e jogados para fora do eixo, estáticos de nossas permanências ilusórias.

Que o mundo não é perfeito e que mesmo sabendo disso, queremos sê-lo.

Nos tempos de crise brotam as incertezas por que nada esteve tão certo.

Tempos de “descer montanhas”
Tempo de mudar,
Tempo de crescer,
Tempo de plantar,
Tempo de romper.
Em tempos de crise… Crianças brincam e Fazemos histórias.

Escrevemos poemas, ofertados como flores que se abeiram nos jardins do cotidiano.

Podemos ler em muitos lugares, que como ondas o tempo leva e o tempo traz. Está escrito nas grandes rochas o que fomos, somos e buscamos ser.

A dança do tempo nos leva a produzir a cada aurora o exercício de ser e mesmo nas escolhas em crise, a rememorar nossos ajustes.

Decreto essencial da vida que acolhe coletividades e que não diz respeito apenas ao Outro. Ampla gama de possibilidades torna, ainda, a necessidade de transformação do homem ensimesmado.

As crises revelam bruscamente que é preciso ajustar. É preciso olhar adiante carregando consigo a consciência dos contrários, por que não está sendo cabível construir nada novo, mantendo velhas relações segmentadoras.

A utilidade desses tempos que circulam é fundamentalmente, o de se colocar no lugar do Outro e saber que além de indignar-se com situações temerárias, é saber o que se projeta e constrói coletivamente para lutar pelo exercício das coisas.

Tempos de crise, tempo doído, indeciso e possível!

“Todas as vidas de Cora Coralina”

Todas as vidas

É com imenso afeto e emoção que divulgo o 1° Longa Metragem sobre a vida e obra da escritora Goiana: Cora Coralina – Todas as Vidas. A primeira exibição do filme foi no dia 15 de agosto de 2015 na Cidade de Goiás, durante 17ª edição do Festival Internacional de Cinema Ambiental (Fica).

A trajetória de Cora é capaz de levar-nos a história do Brasil pela voz de um ator nada privilegiado, a mulher. Esse olhar, entre a casa e a rua foi capaz de construir tanto em seus textos quanto na vida pessoal, a existência coletiva de uma cidade chamada de Cidade de Goyaz, a partir de um Brasil que se constituía como nação.

Plantando pedras e colhendo flores, Cora coralina é o sujeito coletivo de muitas vidas e é um privilégio nacional poder assistir “Todas as vidas de Cora Coralina”, um filme que entre versos e prosas vai contando a história do Brasil e o papel da mulher na sociedade brasileira.

Fica a dica!

Assista o trailer do filme:

Ensaios sobre a literatura

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O principal desafio do processo de autonomização da obra literária é a ruptura com as antigas tradições, com o desinteresse pelas produções populares na ordem da economia cultural. Nesse contexto estrutura-se o princípio autônomo da “arte pela arte”, num processo em que se busca a essência da obra e da arte, instaurando a autoproibição referente às análises das condições sociais e históricas nas quais foram produzidas.

O avanço da autonomia, a busca da essência e da percepção pura fez da obra legítima uma instituição social, com posturas e condições da produção e da leitura a-históricas.

A literatura não pode ser entendida apenas como técnica, pois é fruto do sentido e da individualidade frente ao movimento da vida. Assim, o outro desdobra-se no olhar do autor, ao distanciar-se do familiar, ao contemplar a si de modo diferente, compondo identidades e sentidos para a realidade.

Para Antonio Candido (1995) , a literatura enquanto ferramenta de transformação social, é imprescindível à existência humana, pois ela congrega e humaniza o espírito humano sendo, portanto, um direito inalienável de todos. Na medida em que a literatura possibilita o acesso a outros níveis de conhecimento, ela transforma e amplia a capacidade de questionamento da realidade.

A literatura prima e irmã da arte é um direito, um instrumento de reconhecimento e transformação do mundo.

*Fonte: CANDIDO, Antonio. O direito à literatura, Vários escritos. 3a. Edição. São Paulo: Editora Duas Cidades, 1995. p. 169-191.

O autor e a obra

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“A noção do autor constitui o momento crucial da individualização na história das ideias, dos conhecimentos, das literaturas, e também na história da filosofia e das ciências”. (FOCAULT, 2001, p. 268)

Focault (2001) faz uma analogia interessante entre heróis e autores, talvez essa não seja a mais correta das minhas análises sobre o que o filósofo propôs, mas a ideia de que a criação mitológica dos grandes heróis através da imortalização de uma obra é bem significativa, isso é!

Em sua perspectiva de invisibilidade e morte do autor, posterior a funcionalidade dos grandes heróis, penso que não seja, no momento, a minha opção epistemológica, já que caminho na possibilidade revolucionária e afirmação dos desejos pelo fortalecimento da imagem dos autores. Talvez não queira mesmo reconhecer a ideia de que a obra tenha o direito de matar o próprio autor, despistando sua individualidade particular.

Não creio que esta seja a única forma singular, já que muitos autores se constroem a partir de suas obras, vendo a partir delas um sentido de busca essencial e identitária. Porém devo concordar, se me é permitido, que autor é uma função e, “portanto característica do modo de existência, de circulação e de funcionamento de certos discursos no interior de uma sociedade”.

E como mesmo diz Focault (2001), os discursos começaram a ter autores, na medida em que os mesmos puderam ser punidos e os discursos transgressores. Sendo assim, nomeio a minha rebeldia por Autoria. Sendo este um gesto de poder particular para dizer muitas coisas, que desejo serem apropriadas.

No exercício da razão suprida de emoção, afirmo que homens e mulheres buscaram na prática de seus cotidianos, a afirmação de suas ideias, mesmo quando pensavam não terem ideias próprias, dialogando e buscando serem reconhecidos no mundo.

O autor e obra é o exercício de si mesmo colocado em contexto complexo de convivência com o Outro, se morremos ou não, talvez seja questão de tempo. Mas, quem sabe algumas mortes não sejam necessárias para que possamos renascer através de múltiplas formas?

Fonte: FOCAULT, Michel. “Ditos e Escritos”. Estética – Literatura e pintura, música e cinema (Vol III). Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001. 

Yandê

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Faz tempo que a questão indígena desperta desconfiança e curiosidade em grande parte da população, que busca entender quem são esses indivíduos, pintados e não, que afirmam serem indígenas?

É um tanto desconcertante a ignorância diante da identidade territorial na história do país, a ponto de sabermos muito pouco sobre quem são os povos indígenas do Brasil. Graças à globalização e suas ferramentas que reconhecemos pares e parentes em todos os lugares e as suas referências e vozes passaram a atrair os olhares da sociedade civil. Creio que em pouco tempo ao invés de ouvirmos o questionamento: quem são? Passaremos a dizer quem somos nós diante desde levante da memória.

Nós! Yandê, vem agrupar e distribuir vozes indígenas entre povos que habitam hoje todo o território nacional, nas cidades e aldeias.

Yandê torna-se um convite aos sentidos e ingresso para o que a tradição é capaz de fazer no campo da multiplicidade, de conhecimentos e vivências com Outros.

Alheios ou não de existências, Yandê propõe-se a ser ponte de comunicação por meio da celebração, luta e transformação.

Para quem esteja curioso ou mesmo pretencioso não espere, conheça a radio Yandê feita por indígenas, um espaço para parentes de todas as nações da Terra se encontrar e dizerem que Yandê existe e coexiste.

Levantem e sonhem, pois hoje Yandê* constrói caminhos de quem somos!

*Fonte: Yandé de origem Tupi significa Nós. (Nota do autor)

AMU ITÁ TETAMA

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Daqui deste lugar me enuncio, lugar tão comum a quantos desejem e desse lugar tão necessário é que se cria a epistemologia da afetividade.

A Afetividade legitima falas de lugares distintos e os torna fundamentais para o acesso ao Outro, para o reconhecimento e a valorização da diversidade.

É deste lugar que afirmo que em todos os níveis da vida devemos nos apropriar desse elemento, principalmente no campo cientifico, de outra forma o lugar do Outro fica vazio e rígido.

O conceito de lugar diz respeito aos espaços vivenciados pelas pessoas em suas atividades cotidianas de trabalho, lazer, estudo e convivência humana. Desta maneira, a Geografia humanista define o lugar como uma forma de experiência humana, “um tipo especial de vivência do espaço”. Lugar para a Geografia tem, portanto, o mesmo conteúdo que os fenomenologistas atribuem ao conceito de mundo, isto é, o conjunto das vivências individuais e subjetivas dos sujeitos; “aquilo que em primeiro lugar aparece à consciência” (TURRA, 2009, p. 112).

Desejo construir pontes, ouvir existências no meio da multidão. É dessa forma que desafio paradigmas sabendo que não estou só nesta tarefa árdua, articulando afetividades as minhas produções e levanto a bandeira: – Incluam suas afetividades na academia e fora dela, não tenham medo!!!

A vida é uma busca incessante pelo conhecimento de si e do Outro dentro da diversidade. Não lamento a trajetória que por opção venho desenhando, mas afirmo que ela é escolha feita, após o meu encontro com a diversidade e as suas grandes potencialidades de modificação do mundo e de suas relações. A afetividade é o meu comprometimento político e essencial.

AMU ITÁ TETAMA fala desse lugar difícil de definir em palavras, pois é conceito de mundo, lugar de consciência e de caminhos.

Fonte: TURRA Neto, Nécio. Em busca do lugar reencontrado. In: VESTENA, L. R. et alli (Org.). Saberes geográficos: teorias e aplicações. Guarapuava (PR): Editora da UNICENTRO, 2009. p. 104-124.: http://www.researchgate.net/publication/260415554_Em_busca_do_lugar_reencontrado Acesso em: 28/10/2014.

Profissão: Professora Universitária e Escritora

Cora-Coralina2015

Celebro o meu dever de transmitir e trocar conhecimento. Celebro a liberdade de escolher estar nesse lugar, construindo pontes em chão de pedras e por isso, me permito, por lugar de causa, pedir a benção de Cora Coralina.

Quem melhor construiu pontes fincadas sobre as pedras de uma velha casa em nobre Cidade de Goyaz? Fazendo doces e contando histórias, com açúcar e literatura?
Foi no rastro de Cora que parti. Daquele lugar que me é tão caro para dizer que a literatura transforma e revoluciona.

Cora Coralina e “Goiás Velho”, a cidade se confunde com a mulher madura, a velha sábia, aquela que sabe e por saber protege. A memória ponte de gerações de mulheres que ensinam mulheres fortalecendo a identidade dos anônimos que silenciosos fazem história.

E o sagrado elemento central entre muros, pedras, becos, doces e poesia fortalece o cotidiano de odores e cantigas afetivas no longo drama que se chama vida.

A terra é templo
O lavrador é semeador.
A lavoura é altar.
O grão é oferta.
(Coralina, 1976)